Como podem imaginar, a vitória de Trump foi para mim, como para quase todos os meus amigos americanos, uma espécie de surpresa, que provoca, irresistivelmente, sentimentos de depressão, de medo, até mesmo de pânico… Ora, a filosofia, pelo menos a minha filosofia, declara que, ainda que sejam inevitáveis, nenhum destes afectos poderia preparar uma autêntica resposta política ao desastre. Pois estes afectos depressivos são de algum modo a atestação negativa da vitória de Trump, quase uma maneira de lhe pagar um tributo. Devemos então ultrapassar o medo, o desapontamento e a depressão. Mais do que nunca, o nosso dever é meditar acerca da situação política que é a do nosso mundo, a fim de estar em condições de fornecer uma resposta racional à questão ao mesmo tempo urgente e obcecante: de que é feito o mundo contemporâneo para que a noite passada possa ter acabado num tal horror? Como é possível que alguém como Trump possa ser eleito presidente da maior potência imperial do mundo, os Estados Unidos da América?
Alain Badiou (Rabat, 17 de janeiro de 1937) licenciou-se em Filosofia na École Normale Supérieure e esteve na origem da criação da Faculdade de Filosofia da Universidade de Paris VIII com Gilles Deleuze, Michel Foucault e Jean François Lyotard. Escreveu uma vasta obra em torno dos conceitos de ser, verdade e sujeito, de um modo que não sendo pós-moderno também não se insere na tradição da modernidade. Badiou esteve envolvido em inúmeras organizações políticas comentando regularmente temas da atualidade nesta área. É conhecido pela sua militância maoísta, pela sua defesa do comunismo e dos trabalhadores estrangeiros em França.